segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Comissão de Mobilidade Urbana



Hoje saí do casulo e fui como o Tiago Daitx na audiência pública da Comissão de Mobilidade Urbana da Assembléia Legislativa. Acostumado com as reuniões do Sgarbossa e outros "coletivos" (as aspas é porque acho esta palavra bizonha, mas é o padrão, então tenho que usar), fui com barba por fazer e de camiseta. Agora aprendi: na assembléia todo mundo anda de terno!

Na reunião, alguns deputados, o prefeito de Porto Alegre, diretor de tarifas da AGERGS e ex-presidente da EPTC e professor da Escola de Engenharia, Luís Afonso Senna. A presidência ficou a cargo do deputado Vinícius Ribeiro. Na platéia, mais deputados, secretários de transporte de outras cidades, representantes de um milhão de entidades. Parece que apenas eu e o Tiago não representávamos ninguém!

Ao contrário das outras reuniões que tenho participados, esta foi muito mais formal na sua apresentação. Foram três palestrantes e espaço no final para falas rápidas e perguntas. Embora o presidente tenha sido bastante aberto e, inclusive, vindo falar pessoalmente comigo no final da reunião e me convidando para mostrar o trabalho realizado por este blog em seu gabinete, a reunião em si teve muito o ar de uma palestra.

O primeiro a falar, prefeito José Fortunati, parecia em crise de identidade. O prefeito, um grande incentivador, através de suas políticas, do uso de carro e da destruição dos espaços de pedestre da cidade, falou amplamente das mazelas dos carros e da importância do transporte coletivo. Citou várias vezes que é complicado mudar, pois a sociedade gosta de carros. Ou seja, faz crer que sua política pró-carro é uma demanda da sociedade. Se ele assim o pensa, acho que precisa arejar o seu círculo de amizades!

Se do Fortunati pouco se esperava, o segundo palestrante, professor Senna, foi uma grande decepção. PhD em transportes e maior referência técnica na área de transportes do estado (ao menos em reputação), limitou-se a fazer um apanhado de curiosidades sobre o transporte:

  • Você sabia que a rede de rodovias pavimentadas de Roma no século II d.c. era de 100 mil km, enquanto a do Brasil de hoje é de 180 mil km?
  • Você sabia que os problemas de gestão de transporte de Roma eram semelhantes aos de hoje?
  • Você sabia que se empilharmos as pessoas dentro e fora de um ônibus conseguimos fazer a passagem chegar a R$ 1?
Fora as curiosidades, o debate proposto por ele foi pobre. Citou diversas vezes que o problema é complexo, mas não tentou falar de soluções. Sua única aventura neste ponto foi defender o aumento do número de PPPs e a redução das isenções.

Fora a pobreza, o professor fez diversas afirmações controversas (tentando usar um termo gentil):
  1. O número de carros na cidade vai aumentar, quer gostemos disso ou não: Esta afirmação, em sua cabeça, parece ser embasada nas estatísticas de países desenvolvidos. Entretanto, ele parece ignorar que estes números tem decrescido. Há uma mudança de cultura no mundo. É possível que esta mudança seja passageira e não se consolide, mas é no mínimo temerário dizer que não há como evitar o aumento do número de carros.
  2. Mesmo com mais carros, a cidade não vai parar: Não?!?! Mais uma vez, ele usou dados de outras cidades para embasar seu argumento. Como, entretanto, foi muito bem lembrado por um colega na fase de perguntas, já temos caso de cidades parando por mais de 10 dias! E, convenhamos, Porto Alegre não vai parar. Ela já parou! O tempo de locomoção hoje é totalmente absurdo frente ao que era há poucos anos atrás. Os impactos econômicos desta situação são vultuosos.
  3. É impossível subsidiar 100% da tarifa: Gostando ou não do modelo de subsídio, o fato é que ele existe. Este tipo de modelo possui vantagens e desvantagens, cabendo a cidade pesar cada um deles. Ainda, o professor deixou a entender que temos que combater isso, quando, na verdade, o subsídio direto hoje existente em Porto alegre é zero. Temos, no máximo, isenção de impostos. Mesmo nos EUA, onde os subsídios são baixos, é comum haver algum tipo de repasse estatal.
Por fim, o último palestrante foi o responsável pelo cálculo das tarifas pela AGERGS, ou seja, as tarifas metropolitanas. Esta apresentação foi um show de horrores. O palestrante estava extremamente mal preparado, a apresentação era muito ruim (planilhas ilegíveis, fórmulas mal apresentadas, ...) e a metodologia de gestão das tarifas é de arrancar os cabelos!

Um dos absurdos, pego pelo Tiago, foi que o valor da frota é baseado no valor de custo do ônibus mais comum. Hein?!?! Quer dizer que eles ignoram o valor dos outros ônibus?! As possibilidades de manipulação deste indicador são inúmeras! 

Em resumo, a iniciativa da Assembléia é louvável e deve ser aplaudida. Outras reuniões acontecerão e procurarei voltar a comparecer. O nível técnico de nossos especialistas entretanto - ou, ao menos, sua capacidade de comunicação - está deixando muito a desejar. Se este nível não melhorar, tão pouco melhorará nossa mobilidade.