Na noite de segunda para terça-feira, foi aprovada na Câmara de Vereadores de Porto Alegre a PLC 07/2013. A proposta, encaminhada pelo executivo, isenta de ISSQN o transporte coletivo, modal ônibus. Leia aqui o texto da PLC e suas emendas.
O que deveria ser algo sem maiores críticas acabou tornando-se um embate que levou a votação até a madrugada. a causa foram 15 emendas, a maior parte delas originadas da oposição. Para os comentaristas de Facebook, entretanto, o que ficou da votação foi a rejeição da transparência das planilhas de cálculo.
A Proposta de Lei Complementar
A PLC enviada pelo executivo é bastante simples. Acrescenta as categorias de serviços isentos de ISSQN o serviço de transporte público, modal ônibus. Esta isenção é limitada até o dia 31 de dezembro de 2016. A data limite foi, provavelmente, uma opção do executivo para garantir que não está fazendo futuras administrações incorrer em perda de arrecadação. caso elas desejem, que renovem a lei. Perfeito!
Pois bem, como se trata da alteração de uma lei já existente e não de uma nova, seu texto é bastante claro no que tange a qual lei está alterando: o texto da lei complementar 7 de 1973. Esta lei delibera sobre o sistema de arrecadação da prefeitura. A PLC em votação acrescenta um inciso a esta lei, definindo a nova categoria de serviço desonerado.
As Emendas
Foram apresentadas 15 emendas a este projeto de lei, a grande maioria delas pela oposição. Ganhou destaque, em especial, a emenda apresentada pelo PSOL para garantir a transparência das planilhas de cálculo. Todas as emendas da oposição foram negadas pela maioria governista.
Ao ler as emendas, entretanto, se observa o total desprepara de nossos legisladores! Fica claro que, para eles, leis se escrevem em papel de pão, como provou tão bem a emeda 15 do vereador Alberto Kopittke.
2 cacetinhos, 200 gramas de mortadela e uma peça de salaminho!
Em sua página no Facebook, o vereador Valter Nagelstein argumenta que a emenda que previa "transparência" da planilha de custos, por exemplo, foi derrubada não por seu conteúdo, mas pela forma proposta. E, infelizmente, ele tem razão em parte. Tal como redigida a emenda não poderia ser aprovada, pois ela claramente não dizia o que deveria alterar!
Leia aqui o texto da PLC e suas emendas. Analiso abaixo cada uma delas em detalhes. O texto é longo, mas vale, ao menos, uma olhada na Emenda 2 que é a que gerou comoção pública.
Emenda 1
Autores: Fernanda Melchionna e Pedro RuasDelibera: Associa a lei com a passagem de R$ 2,85.
Esta emenda, bem como sua subemenda, foi posteriormente retirada. Não entendi o seu propósito, pois não faz sentido associar uma desoneração a uma tarifa específica. Talvez o objetivo fosse impedir uma batalha judicial, já que a tarifa foi congelada pela justiça em R$ 2,85.
De fato, não está claro para mim, enquanto o reajuste estiver suspenso, como as desonerações de imposto serão tratadas. Me falta conhecimento jurídico aqui, mas me parece que esta emenda não resolveria o problema.
Emenda 2
Autores: Fernanda Melchionna e Pedro RuasDelibera: Tabela que justifica o aumento de tarifa deve ser tornada pública no mínimo 30 dias antes da reunião do COMTU. Deve ser realizada consulta popular antes da concessão do aumento.
Aqui a parte mais polêmica e onde dedicarei mais tempo: transparência da planilha. Vamos começar do básico então, isto é, o que estamos pedindo?
O texto da emenda diz (textualmente, erros ortografia e pontuação mantidos):
Acrescenta-se onde couber:
Para a concessão de aumento tarifário no transporte coletivo de Porto Alegre, deve ser tornada pública a tabela base utilizada que fundamenta tal elevação de tarifa, com a descrição e valores de todos os insumos e tributos, e enviada à Câmara Municipal de Porto Alegre com, no mínimo, 30 dias de antecedência a reunião de Conselho Municipal de Transporte Urbano - COMTU, que tenha como ponto de pauta a elevação da tarifa.
§1º - Devem ser realizadas audiências públicas e consultas populares antes da votação de qualquer aumento tarifário.Bem, foi pedido então uma planilha, mas quais itens devem estar nesta planilha? A EPTC já divulga uma planilha, embora apenas após a tarifa ser implantada. A planilha já possui o custo dos insumos, tributos, etc. Assim, no meu entender, esta planilha poderia ser, tal como foi redigida a lei, plenamente aceita. Deveria apenas ser apresentada com antecedência. Estas informações são suficientes? Não, como eu mostro aqui.
Assim, embora melhorasse a situação atual ao obrigar a publicação antecipada, ainda assim, esta lei seria insuficiente para dar transparência ao sistema. Contudo, para garantir esta transparência, o parlamentar tem que saber o que pedir, o que não é o caso. Se tivessem lido o material que eu passei para eles (e que nenhum vereador respondeu!), talvez tivessem alguma ideia do que pudesse ser útil.
Um segundo ponto importante é onde este texto deveria ser acrescentado. Claramente não o seria na LC 07/73, pois esta é a lei fiscal do município. De minha parte, julgo que um local apropriado seria a lei 14.459/04 que trata do regime de cálculo da tarifa. De toda a forma, alguém tem que dizer onde colocar. E para colocar em algum lugar pertinente, é preciso conhecer as leis que regem o assunto.
Na emenda proposta, os vereadores resolvem o problema da seguinte forma: "Acrescenta-se onde couber:". Onde couber? Poxa, como será que esta emenda não foi aprovada?! Onde couber! O texto poderia ser escrito, quem sabe, no meio da Sura da Vaca no Corão! Bem, seguramente isto não é problema para os vereadores, desde que esteja escrito em algum lugar!
Quero acreditar que não tenha sido apenas incompetência. Os vereadores não saberiam o que fazer com estes dados, mesmo que viessem bem publicados. Talvez, assim, tenha sido apenas uma manobra política para desgastar quem votar contra. Algo que parece confirmar esta teoria é o fato da emenda prever uma consulta popular antes de qualquer aumento! Claro, claro! Isto é a mesma coisa que definir que o preço da passagem está congelado para sempre!
Emenda 3
Autores: Fernanda Melchionna e Pedro RuasDelibera: Aumento de tarifa só pode ser feito mediante licitação.
Esta até seria uma emenda boa, não tivesse ela também o maldito "Acrescenta-se onde couber:". Ao colocar isto, entretanto, o vereador matou a emenda!
Emenda 4
Autores: Alberto Kopttke, Engenheiro Comassetto, Mauro Pinheiro, Sofia Cavedon, Marcelo SgarbossaDelibera: Cria fundo público que captará a arrecadação das passagens e este fundo será o beneficiário da redução das tarifas.
Como?! Peraí, e a câmara de compensação tarifária? É ela ou outro fundo? E que diferença faz isto? Na minha avaliação, pura politicagem!
Emenda 5
Autores: Alberto Kopttke, Engenheiro Comassetto, Mauro Pinheiro, Sofia Cavedon, Marcelo SgarbossaDelibera: Idem a emenda 2, mas com erro de grafia no COMTU (escrito como CONTU).
Emenda 6
Autores: Alberto Kopttke, Engenheiro Comassetto, Mauro Pinheiro, Sofia Cavedon, Marcelo SgarbossaDelibera: Delibera que a planilha de cálculo da tarifa deve ser revista para contemplar a isenção.
A emenda mostra a ignorância dos parlamentares sobre o assunto. A planilha de cálculo tarifário é regida pela lei 14.459/04 que já determina o papel dos impostos. Assim, remover os impostos já altera o valor da passagem automaticamente.
Emenda 7
Autores: Alberto Kopttke, Engenheiro Comassetto, Mauro Pinheiro, Sofia Cavedon, Marcelo SgarbossaDelibera: Define que a base de cálculo para o recálculo da tarifa deve ser R$ 2,60.
Posteriormente retirada, tal como a emenda 1.
Emenda 8
Autores: Alberto Kopttke, Engenheiro Comassetto, Mauro Pinheiro, Sofia Cavedon, Marcelo SgarbossaDelibera: Altera composição do COMTU.
Honestamente, aqui admito a minha ignorância. Desconheço se a composição atual não seja democrática, conforme dito na justificativa da emenda.
Parece, entretanto, mais uma disputa de poder do que qualquer coisa. Hoje a maior parte dos cargos está com entidades civis e o executivo. A emenda prevê um terço das vagas para membros eleitos, ou seja, abre maior possibilidade para e oposição ser representada.
Emenda 9
Autores: Fernanda Melchionna e Pedro RuasDelibera: Define que o dissídio só pode ser usados na planilha de custos se forem resultado da Comissão de Negociação.
Mais uma vez, admito a minha ignorância. Desconheço no que isto altera na prática o procedimento atual. O fato da emenda não ter justificativa me deixa ainda mais perdido. Algum leitor sabe do que eles estão falando?
Emenda 10
Autores: Cláudio JantaDelibera: Define que estarão isentas de ISSQN apenas empresas com concessão obtida por meio de licitação.
Olha, aí até estaria uma boa ideia. Isto ia aumentar a pressão para a criação de uma licitação. Entretanto, esta proposta teria o resultado imediato de tornar a PLC inútil, pois nenhuma empresa está licitada. Assim, nenhuma redução de tarifa ocorreria...
Emenda 11
Autores: Cláudio JantaDelibera: Garante a isenção apenas para empresas que disponibilizarem sanitários para os funcionários nos pontos de início e fim da linha.
Se empolgou. Simpatizo com este problema para os funcionários, mas o lugar de lutar por isso não é no texto da lei que define o regime tributário do município!
Emenda 12
Autores: Airto FerronatoDelibera: Altera a redação para deixar claro que a isenção é destinada apenas para ônibus.
Deixa claro que a isenção não vale para lotações. Única emenda aprovada.
Emenda 13
Autores: Fernanda Melchionna e Pedro RuasDelibera: Define que a compensação da renúncia fiscal da prefeitura será feita mediante a redução de cargos de confiança e gastos com publicidade.
E como eles pretendem garantir isso? Poxa, vamos deixar o executivo governar gente!
Emenda 14
Autores: Fernanda Melchionna e Pedro RuasDelibera: Delibera que o valor da passagem de ônibus deve levar em conta os tributos que deixam de incidir sobre ela.
Idem ao comentário da emenda 6.
Emenda 15
Autores: Alberto KopttkeDelibera: Define que a isenção deve corresponder em uma redução do valor da tarifa.
Idem ao comentário da emenda 6.
Caro Alex, você já frequentou sessões legislativas? Cobrindo muitas vezes a Assembleia e a Câmara, eu te garanto que coisas como "acrescente-se onde couber" é praxe nos legislativos. Não tem nada de errado.
ResponderExcluirFelipe, se é praxe lamento. Tem que ser mudado.
ExcluirSenhor Alex, suas ponderações sobre as emendas são, digamos assim, sem ofender sua digníssima pessoa, um tanto E quanto tendenciosas. E mais: "Acrescente-se onde couber..." é a forma com que o Parlamento usa para que não implique em erro de principio, fazendo com que a Lei inteira possa ser anulada, por erro.
ResponderExcluirQuanto as outras emendas e seus comentários, lamento, só lamento! Seriam com absoluta certeza a favor da População. Como o blog é seu (como é público estamos comentando), podes escrever e dizer qualquer bobagem...
Senho anônimo,
ExcluirPor que minha considerações são tendenciosas? Por que as emendas seriam a favor da população? Sem argumentos fica complicado discutir.
Sobre a forma de evitar erro de princípio, justamente é este meu ponto. O pessoal não sabe o que está fazendo, aí coloca da forma mais aberta possível para que não dê erro. O nome disso é incompetência!
Alex, como um amigo meu comentou no Facebook abaixo de uma publicação referenciando teu blogue: a oposição foi para o plenário já com voto vencido. Se tivesse a emenda da abertura dos cálculos bem escrita e mais um calhamaço fazendo o embasamento técnico financeiro, seria negada também! A oposição foi para votação com voto vencido! Ou seja, seria perda de tempo!!! O esquema já estava armado pela base governista desde o início! A situação do papel de pão é sempre recorrente quando não existem chances numa votação em plenário. Pesquisa no Google, vais ver outros casos no país que usaram um rabisco feito na hora, as vezes até como forma de protesto. Mas enfim... Todo caso, se achares ainda que fizeram isso por relaxamento ou desconhecimento de causa (o que duvido muito, até porque temos pelo menos representantes ali com ensido superior - advocacia, e mais uma professora), creio que nós, com conhecimento dessa área em específico do transporte público, poderíamos ajudá-los com algo bem escrito ao invés de só criticarmos. Não achas? Não por benefício deles, mas nosso, como população.
ResponderExcluirAna Claudia,
ExcluirNão posso especular se as emendas seriam derrubadas se fossem bem escritas. Apenas posso afirmar que foram mal escritas e, como tal, derrubadas. É preocupante dizer que elas foram escritas assim, pois sabiam que seriam derrubadas, por dois motivos:
1. A situação não quer o melhor para a cidade;
2. A oposição quis fazer apenas uma encenação.
Sobre a ajuda com propostas, dê uma olhada nos outros textos do blog. Tenho justamente trabalhado em dar opções. Já as encaminhei para diversos vereadores, mas não recebi nem um "Obrigado. Continue votando!" como resposta. Sigo fazendo o meu trabalho. Continue ligada para mais propostas e análises (a seguir vou detalhar a planilha apresentada pelo Fortunati).
Hoje já não dá pra dizer que foi no papel de pão, olha:
ResponderExcluirhttp://sofiacavedonpt.blogspot.com.br/2013/07/bancada-do-pt-quer-gestao-publica-no.html
Obrigado, ia atrás desta proposta. Me poupaste tempo! ;-)
ExcluirAgora estou atrasado com uns estudos, mas este fim-de-semana leio com calma o projeto e me manifesto!
Abraços!
Ana, li a proposta!
ExcluirEstá mais madura. Notei que copiou vários pontos do projeto proposto pelo MPL em SP, o que é positivo,- não há porque reinventar a roda.
Entretanto, tal como está redigido, ainda não dá para aprovar. A lei altera totalmente o sistema de remuneração, sem atentar para impactos em outras leis e outros impactos.
Acho que é um bom esboço, mas precisa um pouco mais de trabalho. Não sei se tens ligação com a bancada do PT, mas me disponho a ajudar em alguns pontos, caso eles tenham interesse.
Vou ler mais adiante a proposta do Nagelstein e ver se consigo um tempo para escrever um post mais detalhado comentando ambas as propostas.
Oi...
ResponderExcluirSobre a emenda 2, escreves:
"O texto da emenda diz (textualmente, erros ortografia e pontuação mantidos):"
Eu não achei o erro de ortografia D= Anyway... muito boa explicação sobre as emendas e o que elas propunham \o/ n_n