terça-feira, 18 de junho de 2013

Protestos em Porto Alegre - O Que Aprender com eles?

Ontem participei da versão Porto-alegrense do grande protesto organizado nacionalmente. Tomei um susto com a proporção dele e, mesmo não sendo um especialista, me parece difícil acreditar que tenham sido somente 9 mil pessoas.

Para se ter uma ideia, o protesto ia do início da Salgado Filho até o viaduto da João Pessoa com a Loureiro da Silva. Ou seja, eram, pelo menos, 800 metros de manifestantes andando em duas vias de uma avenida com 30 metros de largura, totalizando 24.000 metros quadrados. Assim, eu chutaria que haveria pelo menos uns 15 mil manifestantes. Ainda assim, isto não é o importante.

Consegui, acompanhado pelo meu amigo Felipe Schnack, cobrir uma boa parte da manifestação, do final até quase frente. Fiquei bastante feliz de ver coisas como:

  • A cada tentativa de alguém cometer um ato de vandalismo, a massa gritava contra a pessoa e ela, constrangida, parava (embora as vezes a ação fosse tão rápida que não dava tempo);
  • A cada tentativa de adotar uma postura mais violenta, todos gritavam "Sem violência!";
  • Poucas bandeiras de partidos e, quando elas apareciam, a massa gritava "Sem partido, sem bandeiras!";
  • A presença da Brigada Militar foi tranquila, apenas acompanhando as pontas do movimento. A EPTC também fez um excelente trabalho de bloqueio das ruas, ao menos sob o ponto de vista de quem estava na manifestação.
Nas janelas, várias pessoas dando gritos de apoio. Enfim, tudo transcorria para calar a boca de quem acha que protestos violentos são necessários para defender uma ideia.

Ao chegar a Ipiranga, entretanto, a marcha virou à direita, claramente se dirigindo à Zero Hora. Aí ficou claro que haveria problemas. E de fato, ali houve confronto. Bombas de gás lacrimogêneo, rojões jogados por manifestantes, etc. Obviamente não ficamos por ali.

Como estávamos de bicicleta, conseguimos flanquear o movimento e ver como a coisa estava do outro lado. A polícia havia montado um cordão de isolamento que se estendia uma quadra em cada sentido. Do lado da Érico Veríssimo, embora o trânsito estivesse interrompido, a situação estava calma. Resolvemos ir cada um para sua casa. Ao ligar a TV, tive a infeliz notícia de que houve mais vandalismo; e vandalismo pesado. Muito triste!

Este não foi certamente o último protesto - outros virão. Este não são protestos organizados por partidos, sindicatos ou pela mídia. Todos estes grupos estão perdidos, tentando entender o que está acontecendo. Pior, não há uma liderança do movimento, nem uma clara agenda que possa ser negociada. É, antes, uma demonstração difusa de insatisfação.

Nos resta, então, descobrir com lidar com isto. Neste processo, provavelmente evoluiremos como sociedade. Seguem então algumas ideias, para cada um dos grupos envolvidos.

Mídia


O discurso já mudou, o que é positivo. Não podem ser escondidos os atos de vandalismo, sob pena de sermos condescendentes. Não podemos, tão pouco, tratar todos manifestantes como marginais. 

Globo e RBS devem também atentar para o fato de serem também alvo da revolta. A culpa não é apenas sua posição ideológica, mas uma série de ações monopolísticas e, em muitos casos, falta de contato com a realidade. Felizmente, a Globo ontem saiu do seu pedestal e admitiu que foi alvo de protestos.

A RBS, por sua vez, segue se mostrando uma organização defasada e que insiste em negar a realidade. Em todos os noticiários, não cita em momento nenhum que o confronto se deu quando os manifestantes tentaram protestar em frente da sede da Zero Hora. Chegaram a dizer que os manifestantes marchavam em direção ao Centro (de onde tinha saído). Este tipo de mentira apenas acirra os ânimos e não ajuda este grupo de mídia.

Políticos


Tanto políticos quanto partidos precisam entender, de uma vez por todas, que eles não representam mais as pessoas. A culpa não é tanto da corrupção. Brasileiro adora reclamar, mas é tolerante com a corrupção. Tanto é verdade que tendem a contemporizar ou mesmo negar os casos de corrupção dos grupos que defendem ideias nas quais acreditam.

O maior culpado é sua incapacidade de se comunicar com seu cliente, o eleitor. Cada ação deve ser discutida e exaustivamente explicada. Somente assim os eleitores voltarão a se sentir representados. Este é um caminho que deve ser principalmente seguido por membros do legislativo e dos poderes locais como a prefeitura.

Polícia


Houve um avanço significativo no papel da polícia após os confrontos da última semana. Entretanto, nada será resolvido com o modelo atual de polícia, ainda defendido por muitas pessoas. A polícia serve hoje para combater o crime, em oposição a proteger o cidadão. Isto significa que eles pretendem capturar os "caras maus" custe o que custar, mesmo que inocentes fiquem feridos. Em resumo, a polícia não protege, ela combate.

Esta premissa, tão usada no dia-a-dia, fica clara para a classe média quando ocorrem manifestações. Ao invés de proteger quem está na manifestação ou proteger edificações e mobiliário urbano, a polícia combate os vândalos. E azar de quem estiver por perto. Assim, temos inimigos ou colaboradores. Por isso todos são suspeitos. Por isto todos devem ser enquadrados

Algumas coisas que devem ser feitas para melhorar nossa polícia:
  1. Fundir as polícias civil e militar em uma única polícia, sob comando civil. A função de militares não é compatível com policiamento!
  2. Acabar com a polícia montada. Ela só serve para meter o terror.
  3. Alterar o foco e o treinamento da polícia de "combater" para "proteger".
  4. Expurgar da corporação todos os selvagens, que tem mais prazer em agredir e humilhar do que servir. Este deve ser um trabalho longo e permanente!

Manifestantes


O primeiro ponto a entender é que a maioria dos manifestantes não querem violência, nem vandalismo. E, quando falo maioria, falo esmagadora maioria. Entretanto, um pequeno grupo, talvez 1%, quer realmente quebrar tudo. Por que? Gosto por destruição, visão que apenas o confronto resolve, acha que uma revolução se atinge com armas, sei lá.

A maioria tem sido bastante clara ao condenar esta ações, mas como impedi-las? Uma coisa é mandar alguém descer de uma parada de ônibus, outra é impedir que alguém mascarado ande para lá e para cá. Mais difícil ainda lidar com alguém que quebrou uma vidraça.

A melhor solução seria a polícia acompanhar o protesto a cada esquina com alguns homens. Deixar isto comunicado para todos os manifestantes. Assim, ao acorrer algo de errado, remover as pessoas da manifestação. Os manifestantes pacíficos podem, inclusive, alertar a polícia! O problema aqui é a relação de confiança necessária entre manifestantes e polícia. Hoje nem a polícia confia em manifestantes, nem manifestantes confiam na polícia. 

Outras ações são evitar confronto. Como? Já que sabemos que temos elementos loucos por conflito, então vamos evitar pontos de conflito. Isto limita o movimento? Infelizmente sim, mas ao menos evita que fiquemos com o gosto ruim na boca de ter ajudado um bando de idiotas a quebrar a cidade.

Como fazer isso?
  1. Estabelecer um itinerário conhecido;
  2. Evitar pontos de conflito, como a Zero Hora;
  3. Terminar a manifestação em um local grande e amplo, como o Largo da Epatur ou a Redenção;
  4. Terminar a manifestação com algo alegre, como uma serenata iluminada ou coisa que o valha.
Devemos fazer isto para sempre? Não, mas até que consigamos domar estes elementos, melhor assim. E o resultado, convenhamos, seria talvez até melhor! 


Analistas


Quando falo de analistas, estão aqui representados diversos grupos: algumas pessoas da mídia, políticos esclarecidos, blogsfera e diversas outras pessoas interessadas no futuro da cidade. Me refiro a qualquer pessoa que queria entender o que está acontecendo, levantar hipóteses e discutir soluções de forma séria e propositiva.

Um analista é uma pessoa que busca informações e tenta extrair significado delas. E o maior problema que temos hoje é entender o que diabos está acontecendo! A pauta de manifestação é grande e difusa. Temos tanto pessoas defendendo o passe livre quanto defendendo a implantação de livre mercado no transporte público. Como conseguir as duas coisas?

Eis o papel do analista! A função de um analista não é entregar o que um cliente pensa que quer: é entregar o que ele precisa. Cabe a nós, desta forma, transformar este amontoado de requisitos disforme e contraditórios em uma proposta clara. Somente então poderemos sair do protesto para a ação real.



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